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quarta-feira, abril 11, 2012

sonhei uma vela


Sonhei uma vela
Na extensa baía
Para lá da janela
Sonhei que partia

E o vento sopra tanto
Impele-me a partir
Desejando o horizonte
Querendo, apenas, ir

No sonho de navegar
Venço a adversidade
Parto, sem esperar
Deixando a cidade

Vou no barco à vela
Que me faz acreditar
Que no fim da viagem
Outro sonho irei tocar

No mar azul ondulante
Vai a branca vela içada
Que em mim navegando
Não pode ser afundada

Vogando em mar aberto
Entre o barco e o céu
Dou o sonho por certo
Toco, afinal, o sonho teu

Este imaginário barco
É um desejo que solto
Só não sei quando parto
Nem sequer quando volto.

terça-feira, setembro 20, 2011

O mais belo poema

O mais belo poema diz assim
Amo apenas um cabelo teu
E a gota de orvalho que dele
Deslizou e se desprendeu
Como lágrimas minhas, sem fim

E a razão porque um poema não se diz
É que depois, o poema prescreve
E da plateia um editor levanta-se e diz
Publicarei toda a prosa que escrever
Mas prometa poemas não mais fazer.

segunda-feira, setembro 19, 2011

os quatro humores do dia


É manhã de luz suave
Ofertando esperança
A dois vivos corações
Os dois numa só dança

E chega o Sol ao pino
No ardor desta emoção
Rodopia em desatino
Tão magna exaltação

Ai, co’as sombras da tarde
Arrefecido esse olhar
De fogo que já não arde
Vejo o fim a aproximar

E à noite, morto o sentir
Vai a alma desamparada
Na fé de repetido porvir
Vagueia só, tresloucada
Buscando aquele sorrir
Luz suave, na alvorada.

quarta-feira, agosto 10, 2011

os merdosos

Dizem-me maluco
maluco não sou
são pessoas fracas
em fortes cadeiras
que trocam por falsas
coisas verdadeiras

(efe. poesia erudita kitschunga)

terça-feira, julho 26, 2011

Castanho cueca

 
Ouvi-te quando disseste
Amor é tudo o que nos une.
Chorei.
Querida, esfreguei o cú
Na tua almofada
E deixei um risco
Castanho de Amor.

Efe (Poesia Kitschunga)
publicado na Revista de Poesia "Piolho" Nº3

segunda-feira, junho 13, 2011

ao figo



Ao figo


Cuidado, gulosos, muita atenção
Sob as figueiras, olho de camaleão
Mirada no figo, mirada no chão
Não seja o caso de pisar poitão.
- Ai que bela recordação.

E o engenho pr’à árvore chegar,
Saltar o muro, na moita agachar,
Esconder na sombra da figueira,
E então, nela, comer a fartar.
- Mesmo à feição.

No início do estio
Marcham marqueses e orjais
E com grande fastio
Também vão lampos e pedrais.
- Que consolação!

A meio do Verão os coitos
Atrás de inchários e braçajotos,
Depois comem-se os vindímos
Já em Novembro os sufenos.
- Ai, a intestinal revolução!

Sorvendo esses frutos divinais
E observando o rasto dum cagão
Vai a mente em figosofias tais
Sobre o calhau deixado no chão
Que depressa passam meses
E arribam os tempos invernais
- Uma desolação.

E lá pr’ó meio do Inverno, o figo torrado, durinho,
Pede bom medronho servido, um a um, ao calcinho.
- Ai, que grande porradão!

Para acabar te digo:
Desta herança dos que já lá vão aos que ainda cá estão,
Come lá mais um figo cá do nosso rincão.
- Ai, ai… corre… corre que vem aí cagação!

Efe – poesia kitschunga

quinta-feira, abril 21, 2011

ressonâncias

Detona o Sol em lances fundidos
E vem Lua nova na maré subida
Do caminho longo, já aturdida
Lívida, arfando, assaz cansada
Vem arrastando os pés doridos

E sobe penosa a encosta final
Parando à porta do vetusto lar
Ajoelha lentamente, faz o sinal
Depois cai, exausta, amparada
Na sua sombra ao luzente luar

E termina o dia a ressonar




poesia kitschunga

segunda-feira, março 21, 2011

dia da poesia

isto é um puema kitschunga
ó dia da puesia

Chegou a primavera
Que anuncia o Verão
Do caboz à cegonha
Seja gente ou bicho
Ou tá cheio de tesão
Ou do pólen marado
Anda com comichão
Parecendo gazeado

Entrou a Primavera
no céu avoa a andorinha
e no mar brilh’a sardinha
e eu fico a ver pasmando
o fim do dia, à tardinha

segunda-feira, fevereiro 28, 2011

O baile na aldeia


Harmónio ou concertina
soa ali na eira vizinha,
limpa de grão e palha,
ao fim do dia, à noitinha.

Já é hora do bailarico,
o tocador aperta ó fole
faz gemer o acordeão
a mocidade emparelhada
rodopia na bailação.

Roda, pula, não fica parado
volteia à direita e leva o par.
Assim se baila no eirado,
toda à noite até o Sol raiar.

E sucedem-se as modas,
as mazurcas, os fandangos,
vem a valsa de Odemira
mais um malhão certinho
e lá do norte soa o vira
depois volta ao corridinho.

Eia roda-viva de outrora,
ordenada pelo mandador
entoada pela cantadeira
feita de alegrias simples
da dançarina e do bailador
no terreiro da nossa aldeia.

Foto-poema feito no baile de Barão de S. João
do mandador Deodato

sábado, novembro 06, 2010

sobreiro




.
Exausto já ia de cansaço
quando o belo sobreiro vi,
verde, belo, sozinho, ali
dando sombra e frescura,
para descanso da andadura
a qualquer forasteiro,
assim está o sobreiro
que na sentida solidão
chega a desejar a ventania
que atira as bolotas ao chão
e faz dos porcos companhia.
.

sábado, agosto 14, 2010

Mar de Fora

Tolice
Descodificar/interpretar um poema é coisa insana, porque é inútil. É como partir em bocados uma imagem para procurar a razão da existência daquilo que ela documenta. Portanto, não irei mais longe do que uma abordagem superficial sobre o livro. Deixo o mergulhar mais fundo neste mar para quem o sabe fazer.

Da poesia
Porque a poesia, toda a poesia, tem dois temas principais, sentimentos de quem sente e a terra de quem vive. É disso que se fala, e raramente de outra coisa. Nomes, rostos, flores, estrelas, pedras, acabarão por remeter para os sentimentos, ou para a terra que ocupamos, com as suas cores, odores, formas do casario, e a agitação da vida da aldeia ou da cidade.

Henrique
A poesia é um diálogo feito de monólogos. Muitos poemas são apenas reflexões íntimas do seu autor mas outros suscitam reacção, convidam ao diálogo, são feitos de palavras que mergulham no interior da pessoa ou da cidade, tocando múltiplos cais de embarque e desembarque que são reconhecidos pelos viajantes/leitores. E essa partilha convida ao diálogo. Os poemas de Henrique Graça são desses, mas são translúcidos, exactos e concretos. Neles não reina a subjectividade, a redundância, a hipérbole, não pontifica a retórica nem maquilhagens ou decorações da escrita. Não há duplicidades. Também não são fragmentos nem ícones. Não são abreviaturas. São percepções completas, embora naturais e francas.

A coisa que seduz
O objecto livro “Mar de Fora” é atraente e dirige a curiosidade, depois encanto, para as palavras, poucas, que suporta. Sendo poucas mas cristalinas, estas palavras conferem uma leveza etérea à obra. Eis o livro enquanto objecto de sedução. E isso não acontece por acaso; para além de anunciado no subtítulo “três sets de escrita com capa, grafismo e desenho”, ao manusear o livro imediatamente damos conta da importância do espaço no papel, seja a mancha preenchida ou a área em branco, seja o uso exclusivo das páginas direitas, ou a opção pelo formato escolhido, os separadores negros como a cortina da noite que cai e anuncia um novo dia, ou a gravura da cidade sugerida em massas disformes, tudo foi pensado para seduzir a mão e o olhar e com isso convidar a ler, a prender às palavras. É simples, e tantos não sabem.

Mas é mar
“Mar de Fora” não é um mar espelhado, não é um mar chão. Tampouco é um mar tempestuoso. Também não é um mar rendido, agora bonançoso depois da tormenta. É antes um mar de vaga ampla, discreta, suave, um mar superficial que rebola sobre um outro mais fundo - os que andam no mar sabem do que falo. Em suma, eu leio um mar que reflui e flui dissipando-se repetidamente num véu de espuma branca que vem repousar suavemente nos areais dourados, sob os nossos pés.

Ir mais longe é ir ao fundo. Fico por aqui, e reproduzo um dos refluxos preferidos deste mar de fora.
Francisco Castelo, Lagos 2010-08-14


choro
porque te queria
aportada mais cedo
nos meus braços

choro
porque quero
que nunca me partas
assim o crepúsculo chegue

choro
porque um cheiro
silvestre de flores
nunca me parou assim

choro
porque ainda encontro
o macio das tuas mãos algodão
amimadas no meu peito

choro
e as lágrimas escarpadas
não são mais que espelho e oxigénio
tudo ainda mais vivo e a pele aquecida

afinal choro
nunca foi nada assim

“Mar de Fora” - Henrique Graça – Lagos, Março 2010 - ISBN 989-96650

terça-feira, junho 15, 2010

domingo, maio 09, 2010

Efígie



Perto do coração a guardava
Em pequena caixa refulgente
Que abria repetidamente
Logo que a saudade assaltava
Levando a alma penitente
Ao frémito num momento
A meio da rua, sob a palmeira
Na canícula ou ao Norte vento
Lembra, assim, a flama verdadeira

.

sexta-feira, março 26, 2010

felicidade

Não é fácil encontrar a felicidade em nós mesmos, e é impossível encontrá-la em qualquer outro lugar.

segunda-feira, fevereiro 15, 2010

na azenha

Tu, debruçada no varandim A camisa molhada alva de cetim E o meu olhar em ti fixado Ora inocente ora culpado O pano tapando do seio a metade Mostra o mamilo erecto apontado Ao riacho que corre urgente Como o meu querer nos labirintos do ser Arrebatado com a água suspensa no ar Poalha das rochas que sobem do leito E a visão celestial do teu sorriso Radiosa neste amanhecer perfeito E bebo da tua cristalina formosura Que acalma o fogo que trago no peito Saciando por instantes a imensa secura.

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

memórias de ti

No mar azul de Agosto
Em perpétuo movimento
Esqueci o teu belo rosto
Até que ergui o meu
Ao céu de anil intenso
E o lembrei de novo
Belo, sereno e perverso.

sexta-feira, janeiro 15, 2010

Esoestérico

Neste esotérico quotidiano
Diurno
Alternado em noite
Nua e carnal
Procuro um veterinário
Para curar o animal
Pequeno
Ferido
Que geme
E oiço
Ténue mas real
O seu gemido
Por entre o dilúvio de luz
Laminada
Em agitação temporal
De cores frias
Azuis e verdes de fel
Procuro
Repito
O mel
Encontro mais adiante
Perdidas no escuro
As emoções contidas
Duplicadas no céu
Nas flores repetidas
Explodindo adiadas
Até que
Caindo
Permanecem quietas
No silêncio
Final
Paradas.
Curado
Levanta-se o animal
Esoestérico humano
Embryos containing human and animal material have been created in Britain.

POESIA KITSCHUNGA

sábado, janeiro 02, 2010

De poeta e de louco, nunca tive pouco

Os que se dedicam aos versos
artífices de inusitadas visões
às musas devendo inspirados
poemas, inflamadas paixões
tantos sonhos desvairados
ilusões e ocultas ambições
advindo da noite aos poucos
suaves entre sombras e casas
revelando a todos, os loucos
sãos que voam alto, sem asas.

terça-feira, dezembro 29, 2009

é a vida


"Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada."
Fernando Pessoa

sexta-feira, dezembro 18, 2009

voo

Pedras talhadas em ângulos
redondos
reverberando a luz zenital
no metal vertical
logo reflectidas
nas tépidas águas.

Ali, corpo imerso
e alma flutuando
aguardando o sopro
da minha boca
exala um leve som
de olhos cerrados
nas profundidades
superficiais
do lago.

Silêncio denso
após gota que cai
dentro do corpo
suspenso
imóvel
inerte no líquido
que dilui
o odor a terra que se eleva
do labirinto subterrâneo
onde o ouvido escuta
as bátegas de água
que alimentam a vida.

Ecoam flautas zoomórficas
que abrem parêntesis
e resgatam estrelas
da incomensurável
profundidade
do buraco negro
que engoliu
perverso
as minhas ilusões.

Posso voar.
Sinto-o no corpo.

...
Desespera-me tanta gente sossegada.

...
Voo.

(efe - colectânea de poesia kitschunga)

quinta-feira, dezembro 10, 2009

Alentejo

Não tem exactamente a mesma luz do Algarve mas tem a calma, o verde, o sol e, sobretudo, o silêncio que o Algarve já perdeu há muito. E uma proverbial indolência inerente aos próprios lugares como que envoltos numa manta de retalhos. Uma manta formada pelo riacho que passa delicadamente por entre os seixos, e os medronheiros suavemente embalados pela aragem que se contorce nas encostas, e o brado da rapariga que chama não sei o quê, ecoando em espiral para o vale numa toada longa e musical. E o “você” com que se tratam gentes e animais, próximos ou alheios, numa delicadeza de diminutivos e outros mimos que o isolamento da serra ou a extensão da planície induzem. E é esta quietude que o Alentejo possui, como um segredo do ritmo da vida e da respiração dos seres, é isto que atrai e enfeitiça.

terça-feira, novembro 17, 2009

num grão, apenas


O teu véu é um suave murmúrio de espuma em seda que desliza pelo colchão de areia sendo nele ausentes os seres desencontrados e diferentes que o espírito das águas anima a partir na manhã cinzenta enxuta e fria perdida nas memórias do que nunca aconteceu por mor de futilidades transformadas em gravidades imensas encerradas num grão de areia.

quarta-feira, novembro 11, 2009

no silêncio da chuva



Chove. Há silêncio, porque a mesma chuva
Não faz ruído senão com sossego.
Chove. O céu dorme. Quando a alma é viúva
Do que não sabe, o sentimento é cego.
Chove. Meu ser (quem sou) renego...

Tão calma é a chuva que se solta no ar
(Nem parece de nuvens) que parece
Que não é chuva, mas um sussurrar
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece.
Chove. Nada apetece...

Não paira vento, não há céu que eu sinta.
Chove longínqua e indistintamente,
Como uma coisa certa que nos minta,
Como um grande desejo que nos mente.
Chove. Nada em mim sente...

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

quinta-feira, outubro 22, 2009

Balada da Neve

Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
– Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...

E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!...

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
– e cai no meu coração.


Agusto Gil in Luar de Janeiro

sexta-feira, outubro 16, 2009

ilha

Sós
em ilha distante
eu
pássaro
de coração encetado,
tu
reflexo da lua,
brilhante.

os dois
estendidos
no areal
sob o manto de estrelas
cintilantes,
o meu olhar
imerso na tua formosura,
e os minutos
em horas
mudados,
e o braço
envolvendo a tua cintura.

bebo
eu,
pássaro,
a tua doçura
e canto,
os lábios apertados
de amargura.

sábado, outubro 03, 2009

num anjinho da Teresa para a Maria

oh anjinho...anjinho.... de pau feito
contigo todas as irmãs se levantam
contigo, eu freira, me deito!

colectânea de poesia kitschunga de efe

;x

segunda-feira, agosto 24, 2009

mente...mente

insidiosa mente
se movi mente
nervosa mente
expectante
de palavras
em papel
procura
saber
se
.
engaja gente
im pertinente
que frequente mente
mente
descarada mente
mente
procurada mente
mas não engana
a gente
.
quem mente
desespera da mente
e aguarda
sofrendo
merecida mente
.

quarta-feira, julho 29, 2009

arco-íris (p/ Ele)




Prostrada sou uma ilha que percorres
E descobres as zonas mais sombrias
Mas nem sabes se grito por socorro
Ou se te mostro só que me delicias
Amigo, amor, amante, amado… eu morro
Da vida que me dás todos os dias

Eu ponho e reponho o meu destino
vou mais longe naquilo que disfarço
Eu ouso o coração e reafirmo
Bordando o arco-íris do que sou frágil

N.

sábado, julho 18, 2009

Peganhento

Colados os barcos ao espelho de água, colada a camisa ao corpo, colada a alma às tripas nesta quentura húmida de Verão sombrio. Presos os pardais ao chão debicando migalhas indolentemente e grudadas as adriças aos mastros sem aragem que as anime nesta pegajosa e quente calmaria escaldam as pedras da calçada e o alcatrão na sombra. Derretem corpos nesta savana estival sem refresco na água tépida imóvel. Exsudando nos areais das praias jazem os corpos inanimados. E do horizonte um ponto se transforma de cinza em branco. Oculta na vaga cavada, apenas com o velame à vista como uma ilha de panos no céu, vem um barco da conquista. Lentamente aproximando, mudo no bater de asa, num desejo maior, na angústia como gaivota pairando no regresso a casa. Os olhos do marinheiro já não fecham nem abrem, são olhos que muito viram, olhos que muito sabem. E peganhento!

domingo, maio 24, 2009

Última Visão Perfeita*

Posto que os mestres todos concordaram
em que era preciso
em que era mesmo o mais importante de tudo
olhar de cima o que está debaixo
para ver debaixo o que está por cima
e claro concordaram todos
diferença de escada ou melhor ombros
quando o corpo ficou decisivamente cheio
decisivamente apto a recomeçar tudo
os abutres até os corvos encetaram imediatamente
um trabalho de fazer sacos
encher armários
e dar voltas à chave sobre o trinco comum
do vidro de ver-se por fora o que está por dentro.

Naturalmente que isto não causou sucesso
pois ninguém se importou vamos lá nada
os mestres os próprios mestres o confessaram
e mesmo começaram a escrever números
ou melhor uma distância grande

Isto sucedeu todos os dias
Calendários diários contaram sempre
tudo com uma distracção perfeita de pancadas
os sinais eram cada vez mais nítidos
pois era evidentíssimo que já nem
reparávamos sequer

quando um idiota perfeitamente solene
berrou que não era preciso
coisíssima absolutamente nenhuma.

Nada
não era preciso nada

a não ser

a loucura de o dizer.


..................................................

O absurdo aparente da desrazão da vida hodierna, num belo poema *de Vieira Calado. Mais poemas para apreciar no blogue do autor, aqui.

sexta-feira, maio 22, 2009

arroto

.
Um arroto
depois
de um bom almoço
é
um
POEMA!

.

quinta-feira, maio 14, 2009

uma coisa a fingir

Acreditamos piamente
Que é mal da memória
Um mal do antigamente
Como um fado da história
E não coisa do presente
Ter políticos fingidores
Fingindo continuamente
De engenheiros sabedores
E nós, crendo cegamente
Cuidamos, enganados
Que tais subtis doutores
Regem bem, honestamente
Porém, ai…fomos roubados!
Pelos pulhas fingidores
E quando abrimos os olhos
É tarde…
… estamos cagados!

Poesia kitschunga parida numa janela de comentário

;p

sexta-feira, abril 24, 2009

isto...

... é um poema

quarta-feira, abril 01, 2009

Ao amanhecer


Na neblina viscosa e húmida
vejo o fantasma de um barco
caravela de muitas descobertas
perdida na vastidão das águas
ao amanhecer.

Num momento de contemplação
observo-a voando em linha recta.
Linha imaginada no centro do rio
ao amanhecer

Nessa hora ainda difusa e húmida
que em mim traduz a solidão
observo a gaivota que voa
e ela prende-me com um laço
ao céu, ao rio, à memória de ti
outrora ancorada no meu ser
ao amanhecer.
.

quarta-feira, março 25, 2009

vasos sanguíneos dilatados

Como árvores noutra distância
um bando de nuvens vindas de longe
ancora no azul pálido do meu céu
Meu?
E nas águas lisas se reflecte
o rosto simétrico iluminado
quase materializado
quase matéria inaudível
um rosto quase morto
na sombra do barco flutuante
Meu?
Pensativo no constante partir e chegar.
Que faço aqui, encerrado em corpo
herdado que me é estranho?
Eu sou eu?
E este corpo é meu?
Se sim, não sei.
Nem se espera um começo, amanhã
o teu.

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

borração


bebendo, bucólico
um alcoólico
chora um desamor
de coisas falsas
mas, de repente
dentro das calças
um viscoso sente.
:\

domingo, fevereiro 08, 2009

poesia popular, certamente

POEMA da 'MENTE'

Há um primeiro-ministro que mente.
Mente de corpo e alma, completa/mente.
E mente de modo tão pungente,
Que a gente acha que ele mente sincera/mente.
Mas que mente, sobretudo, impune/mente...
Indecente/mente.
E mente tão habitual/mente,
Que acha que, história afora, enquanto mente,
Nos vai enganar eterna/mente.